Fonte: Hydrogen Council, 2017: https://hydrogencouncil.com/en/study-how-hydrogen-empowers/)
Como encontrar o balanço entre tecnologias inovadoras e a estabilidade do sistema elétrico na transição energética
Escrito por Vinícius Vidoto e Daiane Elert da Mitsidi em outubro de 2021
Estamos vivendo um momento de muitas mudanças e estas estão cada vez mais aceleradas. Exemplo disso é a transição energética, em que o mundo tenta sair de uma matriz energética altamente dependente de fontes fósseis e avançar até uma matriz sustentável. Segundo relatório emitido pela Irena: “Formou-se um consenso de que uma transição energética baseada em fontes renováveis e tecnologias que aumentam a eficiência e a conservação é a única maneira de nos dar uma chance de limitar o aquecimento global a 1,5 °C até 2050” (World Energy Transitions Outlook – 1.5⁰C Pathway, 2021).
Neste contexto, dentre as soluções tecnológicas que se apresentam, a maioria envolve geração de energia renovável direta (solar, eólica), eletrificação dos meios de transporte, medidas de eficiência energética, produção de hidrogênio verde e produção de bioenergia combinada com captura e armazenamento de carbono (BECCS). No entanto, todas essas tecnologias, tidas como revolucionárias ou salvadoras, possuem seus desafios de implementação e utilização, requerendo, portanto, uma avaliação minuciosa sobre seus pontos fortes e fracos para se encontrar um balanço que realmente promova a estruturação de uma matriz energética diversificada, robusta e sustentável para o mundo.
O Brasil se orgulha de possuir umas das matrizes elétricas mais limpas do mundo, a qual é composta majoritariamente por usinas hidrelétricas. Ao longo das últimas décadas, a participação percentual dessas usinas na matriz vem caindo devido às restrições ambientais impostas a projetos hidrelétricos com grandes reservatórios e a inserção de outras fontes, tais como eólica, solar e biomassa, as quais vem dominando o setor.
Fonte: Portal de notícias do Governo do Brasil, 2021: https://www.gov.br/pt-br/noticias/energia-minerais-e-combustiveis/2021/08/entenda-como-a-matriz-eletrica-brasileira-esta-mudando
No entanto, a natureza intermitente e sazonal dessas fontes aliadas à redução da capacidade de regularização do parque hidrelétrico trouxeram uma problemática consigo, uma vez que o sistema elétrico brasileiro ficou mais exposto ao regime de chuvas (usinas hidrelétricas), às variações climáticas (solar e eólica) e à sazonalidade de safras (biomassa). Como consequência, o sistema acaba precisando recorrer ao acionamento de usinas termelétricas para suprir a falta de energia gerada pelas usinas renováveis nos momentos de escassez, o que, do ponto de vista de matriz elétrica sustentável, não é o ideal.
Sendo assim, no que se refere à geração de eletricidade, existem dois grandes desafios referentes à transição energética: armazenamento de energia em grande escala e/ou para modais intermitentes e biocombustíveis avançados para substituição de combustíveis não renováveis. Especificamente para o caso do Brasil, cuja matriz elétrica vem sendo alterada significativamente ao longo das últimas décadas, a importância da superação desses obstáculos se tornou peça fundamental para sua transição energética.
No contexto mundial, algumas tecnologias têm se destacado, tais como:
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Hidrogênio verde: Alternativa de combustível para geração direta e armazenamento de energia (em grande escala) gerada em períodos favoráveis para ser usada em períodos desfavoráveis;
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Baterias de Íons de lítio (lo-ion), Sódio e Enxofre (NaS), Bateria avançada de Chumbo Ácido ou Zinco/Cloreto (Redox Flow): Armazenamento em pequena escala da geração distribuída até o armazenamento em grande escala de geração proveniente de parques eólicos e fotovoltaicos;
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Biocombustíveis com ou sem captura de carbono: incluem o etanol, a biomassa, o biometano e o biodiesel, cuja produção de energia pode ou não estar relacionada à captura de carbono resultante do processo de queima desses combustíveis.
No entanto, com exceção do etanol e da biomassa, no Brasil, a implementação em massa dessas tecnologias ainda está há anos de se tornar realidade e, enquanto essas tecnologias não chegam ao Brasil, é preciso pensar no que há a disposição para lidar com a necessidade de acionamento de usinas térmicas para garantir a estabilidade do sistema elétrico e o suprimento da demanda de energia.
Neste cenário, o gás natural é uma alternativa que tem provado ser mais eficiente que outros combustíveis fósseis, principalmente quando equiparado ao carvão e ao óleo, apesar de ainda apresentar um considerável impacto ambiental devido às emissões de gás carbônico. Comparativamente, a queima do carvão emite mais do que o dobro de dióxido de carbono que o gás natural para gerar a mesma quantidade de energia, seja ela na forma de calor ou de eletricidade. Em relação à eficiência, uma usina térmica a carvão tem, em média, 33% de eficiência, enquanto, para uma usina térmica a gás natural, essa eficiência é de 44%, podendo chegar a 60% para usinas com ciclo combinado. Outro ponto importante se refere ao fato de que usinas a gás natural têm um tempo de partida consideravelmente menor, em torno de 20 minutos, do que as usinas convencionais a carvão, de 1 a 6 horas.
Fonte: Smart Energy International, 2019: https://www.smart-energy.com/regional-news/north-america/ge-badly-misjudged-clean-energy-transition-cost-investors-193-million/
Em 2020, houve uma queda de 1,9% do consumo do gás natural no mundo devido à pandemia de COVID-19 e a ocorrência de um inverno mais ameno no hemisfério norte. No entanto, estima-se que haverá um aumento do consumo de 3,6% para o ano de 2021, em relação ao ano de 2020, e de 7% em relação aos níveis pré-pandemia até 2024. Esse aumento põe em risco o alcance das metas definidas pelo Acordo de Paris e, com o intuito de minimizar essas consequências, algumas medidas podem ser tomadas, tais como:
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Redução da emissão de gases de efeito estufa das cadeias de abastecimento: refere-se, principalmente, à redução das emissões de metano, considerando que 40% destas emissões poderiam ser evitadas sem nenhum custo líquido nas operações com petróleo e gás;
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Suporte à integração e implantação de gases de baixo carbono: refere-se ao suporte à redução dos custos de produção do biometano, hidrogênio e metano sintético, cujas tecnologias de produção ainda não são competitivas;
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Minimizar as emissões que ocorrem a partir da combustão do gás natural através de soluções de gestão de carbono: engloba a captura e armazenamento de carbono [CCS] e captura, utilização de carbono e armazenamento [CCUS]), os quais poderiam reduzir significativamente as emissões do uso final do gás natural, tanto no setor industrial quanto nos demais setores de energia, inclusive para a produção de baixo teor de carbono à base de gás hidrogênio.
Sendo assim, podemos concluir que se obteve um avanço tecnológico significativo nos últimos anos no que se refere ao desenvolvimento de alternativas de geração de energia sustentável, incentivada principalmente pelo comprometimento das nações na busca por um mundo onde o homem cause menos impacto ao meio-ambiente. Cabe agora, aos órgãos governamentais, traçar estratégias que maximizem o aproveitamento dessas tecnologias na sua matriz energética para que a humanidade, como um todo, colha os frutos desses avanços.
Quanto às tecnologias citadas, o avanço das energias solar e eólica são importantes para a manutenção da sustentabilidade da matriz energética brasileira, mas a utilização de biocombustíveis e do gás natural podem ser formas de tornar o sistema energético brasileiro mais resiliente às mudanças climáticas que já estão nos afetando enquanto novas formas de armazenamento energético (hidrogênio verde e novas tecnologias de baterias) não se consolidam nacionalmente. O gás natural pode, inclusive, ser obtido de fontes menos agressivas ao meio ambiente, como a captação de metano de aterros, que evita a emissão desse gás na atmosfera e a queima para geração de energia, algo benéfico, apesar de não ideal, pois o fator de aquecimento global do metano é 25 vezes maior que o do gás carbônico.
Após avanços nas tecnologias de armazenamento energético, principalmente do hidrogênio verde, uma grande aposta nacional e mundial, é possível se distanciar também do gás natural, tanto na sua utilização para geração de energia elétrica, quanto na sua utilização para geração de energia térmica. Isso indica que estudos e pesquisas ao redor dessa tecnologia são de extrema importância, mas sem negligenciar a importância e a colaboração de outras tecnologias como dos biocombustíveis, já enraizados na matriz energética brasileira.
Referências:
https://www.irena.org/publications/2021/Jun/-/media/D491BFC62BC7462A898D7837A669DC4D.ashx
https://www.enelgreenpower.com/pt/learning-hub/energias-renoveveis/armazenamento
https://www.eia.gov/tools/faqs/faq.php?id=107&t=3
http://mediadrawer.gvces.com.br/ghg/original/ghg-protocol_nota-tecnica_valores-de-gwp_v1.pdf
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